sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Billings

Domingo, 8/Ago (72º dia de viagem)
A caminho de Fort Nelson, a rodovia cruza por imensa floresta de pinus, conhecidos por taigas, vegetação característica de áreas próximas ao Círculo Polar. São dias e dias inteiros, viajando dentro dessa vegetação. E para complicar, hoje tivemos um incêndio na mata. Longe da estrada, mas o suficiente para bloquear algumas rodovias, devido à intensidade da fumaça. Felizmente, por onde passamos, estava liberado o trânsito. Mas a visibilidade era pouca.
E de repente, um bisão solitário à beira da estrada. Algumas fotos e... espere, logo mais à frente, vários, dezenas deles, uma manada inteira tomando conta da estrada, das laterais, trânsito parado, fotos, suspiros. Ninguém buzina. Todos aguardam pacientemente, que os bichos liberem o trânsito. Mas eles não têm pressa. É terreno deles. Os invasores que aguardem. E o maior deles, o que parecia ser o grande chefe, tomava conta do asfalto. Parado bem no meio, ocupando toda a pista, olhava para um lado e para outro, e parecia dizer “daqui não saio, daqui ninguém me tira!” Desligamos os motores das motos para não assustar os bichos. Só então nos demos conta de que estávamos à mercê deles. E se de repente um deles resolvesse investir contra nós? Quem estava de carro, estava protegido. Nós não. Éramos alvos fáceis. Instintivamente, ligamos os motores e para nosso alívio, o poderoso bisão cedeu lado. Ufa!
Mais à frente, foi a vez dos caribus aparecerem. Muito ariscos e rápidos, não posam para fotos. Num piscar de olhos, somem na floresta.
E os ursos? Os amigos ursos ainda não deram o ar da graça. Estão em dívida conosco.
Completando a jornada, chegamos a Forte Nelson. Finalmente. Foram quase mil quilômetros rodados hoje. Boa tocada!
Fizemos uma pequena alteração no roteiro, e iremos direto a Billings, Montana, nos Estados Unidos. Durante o trajeto, a chuva foi uma ameaça constante. Negras e carregadas nuvens sempre pairando à nossa frente. Porém, todos unidos numa corrente de pensamento positivo, e a estrada caprichosamente mudava de direção, levando-nos para longe do aguaceiro. Isso até parece estranho, mas às vezes, um verdadeiro fazedor de chuva se empenha ao máximo para que a chuva não venha estragar o passeio.
Temos observado também, grande mudança na paisagem. Deixamos para trás as florestas de pinus do Alasca e do Canadá, as espetaculares Montanhas Rochosas da região de Jasper e Banff, e agora rodamos por uma planície sem fim, de terras cultiváveis e de criação de gado em gigantescas fazendas, iguaizinhas àquelas que estamos acostumados ver em filmes.
Em Billings, fomos recebidos pelo simpático casal Magnus e Carole, e seu filho Nicolas, brasileiros que aí residem e que nos acolheram em sua casa.
Ponte no Canadá

Que belo bife!





Monte Kitchner


Passagem para animais silvestres


Na loja HD em Billings

Skagway

Quarta-feira, 4/Ago (68º dia de viagem)
Um trem como nenhum outro...
Um trem nascido durante a Fiebre de Oro de Klondike e construído, apesar de todos os obstáculos, para levar a esperançados buscadores de minas, a seus sonhos de ouro.
Hoje, cem anos depois, a White Pass & Yukon Route, ou simplesmente WP&YR, leva uma classe diferente de exploradores: aqueles em busca de grandes aventuras e de cenários que só pode oferecer a Última Frontera.
Enquanto ouvimos o suave tac-tac ao longo das ladeiras de puro granito, e do silvo do apito do trem que cruza por abismos de profundos precipícios, pensamos naqueles famosos e destemidos aventureiros que fizeram essa viagem a pé, e damos graças à nossa boa fortuna por estarmos acomodados em tão confortável assento no vagão do trem.
Para um dia de hoje, um passeio especial: de trem, até Skagway, no Alaska, às margens do Oceano Pacífico. Folga para nossas valentes motos.
Um ônibus nos leva, de Whitehorse até Fraser, já na Columbia Britânica. Lá embarcamos no famoso trem. Serão 27 milhas através de montanhas com picos nevados, pontes, túneis, precipícios, ferrovia literalmente pendurada em paredões de pedra, até Skagway, às margens do Pacífico, cidade pertencente ao Alaska.
Essa ferrovia foi construída para levar o ouro encontrado nas montanhas, até o porto em Skagway, e dali para o mundo. Retratos dessa época são vistos em toda parte. Nas casas antigas e conservadas até hoje, nos bares, saloons e a grande quantidade de joalherias.
A cidade é pequena. Sua população é de 750 habitantes. Em 1898 chegava a 10.000. Entretanto, diariamente a cidade é invadida por milhares de turistas, que chegam de trem, de carro, de ônibus, ou de navio. No píer, quase dentro da cidade, contamos quatro transatlânticos atracados. E todos lotados de turistas ávidos na compra de lembranças.











Começando o retorno

Domingo, 1º/Ago, a Terça-feira, 3/Ago (65º ao 67º dia de viagem)
Iniciamos nossa jornada de volta para casa, bem cedo, depois de um reforçado breakfast, e uma visita à loja de conveniências do hotel, onde cada um preparou o seu “catanho”, à base de sucos, salgadinhos, frutas secas, biscoitos e barras de cereal. Detalhe: tudo incluso no preço da diária.
E a rodovia. Como estará a rodovia até Fairbanks? Essa era a grande indagação entre nós. Ninguém tinha a resposta. A expectativa era grande. Não choveu nos dois últimos dias. Bom sinal. A torcida para que não chovesse no dia de hoje era grande. E nossas preces foram ouvidas, e atendidas. E mais que isso. Hoje é domingo, e nesse dia, os trabalhos de manutenção na rodovia são suspensos, exceto nas partes críticas. Isso significa que não encontraríamos aquela temível dupla, caminhão d´água & patrola, o grande terror dos motociclistas.
No geral, a estrada estava boa, e cobrimos o percurso de 912 quilômetros em 12 horas e trinta minutos.
O hotel que ficamos em Fairbanks (Blue Roof Bed & Breakfast) nos proporcionou a rara oportunidade de fazermos uma refeição do tipo “caseira”. Gentilmente nos cederam a churrasqueira a gás para assarmos o nosso próprio churrasco. No supermercado mais próximo e compramos os ingredientes necessários: salsichas, hamburgers (daqueles bem grandes, suculentos), pães, e cerveja. Bud Light, naturalmente.
Na manhã seguinte, enquanto uncle Joe preparava nosso breakfast, uma importante reunião entre os expedicionários: nossas motos necessitavam urgentemente de lavação (estavam cobertas de lama do Alaska) e inspeção mecânica (luzes, filtros, freios). A oficina Harley em Fairbanks não trabalharia naquele dia, segunda-feira. Então precisávamos tomar uma decisão: aguardarmos até amanhã para fazer esses serviços, ou tocarmos até Whitehorse, cidade mais próxima em nosso roteiro que tem oficina Harley. Conscientes de que nossas motos necessitavam urgentemente de inspeção técnica sobre as condições de viagem, decidimos seguir. Seriam 949 quilômetros, pelo trecho em que o asfalto apresentava as piores condições que enfrentamos até aqui: muito loose gravel (pedriscos sobre o asfalto), ondulações longitudinais, e grandes trechos em obras.
Na saída de Fairbanks, um instante de encantamento e magia, onde voltamos a ser crianças. Em North Pole, visitamos a Casa do Papai Noel.
Depois de algumas horas de viagem, a fronteira com o Canadá. Agora vamos para a aduana. Por aqui existe uma particularidade. Ao contrário das complicadas aduanas, onde, ao cruzar uma fronteira, é necessário “fazer” duas aduanas: uma de saída e outra de entrada, aqui só se faz uma. A de entrada. Então, tínhamos pela frente a aduana do Canadá. E para surpresa nossa, a funcionária que nos atendeu, falando em bom português, nos deu as boas vindas. Uau! Como é bom compreender todas as perguntas que nos fazem. E responder, e ser entendido. Explicou ela, que é nascida no Canadá, filha de portugueses. Que gosta quando tem a oportunidade de conversar com alguém, na língua de seus pais. Ficaríamos mais tempo conversando com ela, porém ela precisava trabalhar, e nós, seguir nossa viagem.
Neste trecho de estrada, nos chamou a atenção, a grande quantidade de ciclistas viajando. Sós, ou em duplas, bicicletas cheias de alforjes, pacientemente eles vencem grandes distâncias. Haja resistência.
E em Destruction Bay, às margens do Kluane Lake, lá está aquele carro de polícia, vigilante. É visível de longe. Instintivamente, todos diminuem a velocidade. Também pudera, a polícia está logo ali. Mas para surpresa geral, não passa de uma placa, em forma de carro. Carro de polícia. Mesmo quem conhece, quem já passou por ali várias vezes, fica na dúvida e diminui a velocidade. Vai que tiraram a placa e é polícia de verdade!
Chegamos a Whitehorse bastante tarde, e dedicamos o dia seguinte a cuidar das motos, e nos preparar para um passeio de trem a Skagway, para amanhã.
Alaska Highway



Alaska Highway - manutenção

Em Fairbanks, com Joe

Parada para descanso...

Chegando ao Canadá - Yukon Territory
Autorizada Harley Davidson em Whitehorse

Electra com reboque, verdadeira febre dos viajeros

Whitehorse - registrando a viagem

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Prudhoe Bay

Sábado 31/Jul (64º dia de viagem)
Impossível não falar sobre o hotel que estamos hospedados em Deadhorse: o Artic Caribou Inn. Como todas as construções daqui, são compostas de vários conteiners ligados entre si, formando extensos corredores, em várias alas. Os apartamentos são pequenos, porém muito confortáveis. Tudo climatizado. A diária custa 190 dólares para duas pessoas, pensão completa: “all you can eat”. E a comida é da mais alta qualidade. Frutas frescas, saladas verdes, várias opções de carnes, sempre servidos em um bufê muito bem arrumado. Refrigerantes e sucos à vontade, o dia todo, que você mesmo se serve, na máquina. Eu chamaria isto de um verdadeiro centro de engorda. Precisamos “vazar” daqui, sob pena de sobrecarregarmos as motos na volta.
Conforme previsto, hoje fomos conhecer Prudhoe Bay. A segurança é rigorosa. Veículos particulares são barrados. Somente podem circular por lá, os veículos das empreiteiras, e o ônibus do hotel que nos leva. O nosso guia, que é também o motorista, explica tudo detalhadamente. Em inglês. Nada compreendo. O MacGyver, nosso intérprete, traduz os tópicos mais importantes. Prudhoe Bay é uma base produtora de petróleo. Não tem moradores fixos. O regime de trabalho é de duas semanas aqui, e duas em casa. Os operários vão e vêm, sempre de avião.
Rápida parada do ônibus, e nos é dada a rara oportunidade de termos contato com as águas do Oceano Glacial Ártico. Momento único que é festejado por todos. Alguns até ensaiam um mergulho, porém, mais parece uma cerimônia de “lava-pés”. Não tinha gelo boiando na água, mas estava um frio de rachar.
Final de tarde, necessitamos aprontar nossas motos para a longa jornada de volta. Estão cobertas de lama. Uma delas, quase perdendo o suporte da sinaleira traseira; outra quebrou os dois suportes do morcego; outra perdeu a mola do pezinho, e outra rompeu os dois suportes das malas laterais. Os tanques estão vazios. Faremos o possível para que todas cheguem a Fairbanks, a mais próxima oficina HD, a 880 km daqui.
Equipamento de extração de petróleo


Abastecendo para o retorno

Veículos de trabalho

Aqui também tem uma floresta!

Pneus para andar no gelo

Praia do Oceano Ártico

Com os pés no Oceano Ártico


Deadhorse

Sexta-feira 30/Jul (63º dia de viagem)
Desde a nossa chegada a Coldfoot, ontem à tarde, ouvimos diversos comentários a respeito da estrada até Prudhoe Bay, do péssimo estado em que ela se encontrava devido a fortes chuvas, e, pior, que as Harleys não passariam. Um verdadeiro terror. E isto vinha principalmente de motociclistas que passaram, em suas bigtrails. Ouvíamos cada um deles atentamente, fazíamos perguntas, ficávamos a imaginar o que realmente nos aguardava. Dormimos abraçados com a incerteza do próximo dia. Mas, durante a noite, o amigo travesseiro aconselhou: “Sigam! Vão conferir! Afinal, vocês vieram de tão longe, e não vão desistir agora, vão?”
Amanheceu (se é que anoiteceu!) com tempo firme. Só um espesso nevoeiro cobria os morros vizinhos. Aqui e acolá já se via sinais do sol conseguindo furar o escudo formado pelas nuvens. Bom sinal.
Após dois meses de viagem, não precisamos de muita conversa para tomar uma decisão. Bastou olharmos uns para os outros, e num instante já estávamos prontos, decididos a enfrentar o último trecho a nos separar de Prudhoe Bay. Os cinco possantes motores roncaram e partimos. Os tanques foram enchidos até a boca, com a moto em pé (bem na vertical) para caber mais combustível, e ainda, alguns galões sobressalentes para enfrentarmos algum imprevisto, e ganhamos a estrada.
A rodovia AK-11, ou Dalton Highway, está em obras, em toda a sua extensão. E o terror dos motociclistas é a dupla, patrola e caminhão da água. A primeira aplaina a estrada, deixando atrás de si, muita terra fofa. E o segundo, joga água, para que, com o movimento dos caminhões, compacte o piso. Só que, enquanto não passarem os caminhões, e aquela água não secar, fica um lamaçal só. Não há moto que resista. É queda na certa.
Nestes 390 Km que separam Coldfoot de Deadhorse, a rodovia está em boas condições, permitindo velocidades de até 100 km/hora, com toda segurança. Após Happy Valley, que alegria. Asfalto, o velho e bom asfalto, e por 45 Km.
À medida que avançávamos em direção ao Oceano Ártico, a paisagem ia mudando. Os bosques de pinheiros deram lugar a extensa pradaria coberta por capim. As montanhas sumiram. Muito longe, no horizonte, o céu azul e a terra se encontravam. Nenhum sinal de chuva. Agora nada mais era capaz de nos deter. Deadhorse estava bem ali, quase podíamos tocá-la com as mãos.
Às quatro da tarde, estacionamos as Motos em frente ao Artic Caribou Inn, em Deadhorse, depois de rodar 24.238 quilômetros. Amanhã iremos a Prudhoe Bay, de ônibus, pois não é permitida a entrada de veículos particulares. Somente excursões organizadas.
Alerta sobre o próximo abastecimento...



A patrola acabou de passar por aqui!


Em algum lugar do Alaska...



O Oleoduto acompanha a rodovia







Deadhorse à vista!

O Hotel